FLORBELA ESPANCA: o grito feminino na literatura portuguesa


Florbela Espanca foi uma poetisa portuguesa que viveu entre os anos de 1894 e 1930. Nesses curtos e intensos 36 anos, a autora deixou uma vasta obra com temáticas que abordam amor, solidão, angústia, erotismo e feminilidade – de modo a romper com a visão tradicional e conservadora que a sociedade de sua época tinha a respeito da figura feminina.
Sobre sua biografia, é importante ressaltar que Florbela iniciou sua jornada literária com apenas nove anos, a partir da criação do poema “A vida e a morte”. A escritora, que teve uma vida carregada de traumas e infelicidades (o que engloba desde o não reconhecimento de sua paternidade a três casamentos mal sucedidos, abortos involuntários, morte do irmão em um trágico acidente de avião, tentativas falhas de suicídio, edema pulmonar e suicídio no dia de seu 36º aniversário), foi símbolo do feminismo em Portugal – afinal, foi a primeira mulher a cursar Direito na Universidade de Lisboa e, mais ainda, a primeira mulher a se destacar na literatura portuguesa: seu reconhecimento, porém, só viria após a sua morte, com a publicação do livro “Charneca em flor”, em 1931.
Seus poemas, em grande parte, se tratavam de sonetos (estrutura poética que apresenta quatro estrofes: dois quartetos, seguidos de dois tercetos). Neles, Florbela se vale do uso da primeira pessoa do singular para explorar e externalizar os mais íntimos sentimentos do seu eu.
Ademais, a respeito da obra dessa grande poetisa, têm-se: “Livro de mágoas” e “Livro de Sóror Saudade”, os únicos que a autora publicou em vida, lançados respectivamente em 1919 e 1923. Após sua morte, em 1931, temos (dentre outras obras) a publicação de “Charneca em flor”, seu livro mais reconhecido.
Retrato de Florbela Espanca.. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Florbela_Espanca> Acesso em 25/05/2020


Veja a seguir dois poemas de Florbela Espanca:

FANATISMO
Minh'alma, de sonhar-te, anda perdida.
Meus olhos andam cegos de te ver.
Não és sequer razão do meu viver
Pois que tu és já toda a minha vida!

Não vejo nada assim enlouquecida...
Passo no mundo, meu Amor, a ler
No mist'rioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!...

"Tudo no mundo é frágil, tudo passa...
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim!

E, olhos postos em ti, digo de rastros:
"Ah! podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus: princípio e fim!..."

Publicado no “Livro de Sóror Saudade”, em 1923, Fanatismo é o poema mais conhecido de Florbela. Musicalizado por Fagner em 1981 (veja o vídeo a seguir), o texto aborda um amor extremamente forte, no qual a pessoa amada se torna uma obsessão para o eu lírico, que a coloca como o que dá sentido a seu viver.

Cantor brasileiro Fagner musicalizando o poema "Fanatismo", de Florbela Espanca. Disponível em: <https://youtu.be/8Du6lk_ncUw>

A MULHER

Ó Mulher! Como és fraca e como és forte!
Como sabes ser doce e desgraçada!
Como sabes fingir quando em teu peito
A tua alma se estorce amargurada!

Quantas morrem saudosa duma imagem.
Adorada que amaram doidamente!
Quantas e quantas almas endoidecem
Enquanto a boca rir alegremente!

Quanta paixão e amor às vezes têm
Sem nunca o confessarem a ninguém
Doce alma de dor e sofrimento!

Paixão que faria a felicidade.
Dum rei; amor de sonho e de saudade,
Que se esvai e que foge num lamento!

Tal poema foi publicado em 1994 na obra póstuma “Trocando olhares” e coloca a mulher em foco. Nesse texto, a figura feminina é retratada como um ser forte, capaz de suportar grandes dores enquanto, externamente, não demonstra fraquezas. Em sua obra, Florbela expunha e discutia o papel social da mulher na época em que vivia – o que a fez ser considerada um símbolo do feminismo em Portugal.

EXERCÍCIOS

(para 6º, 7º e 8º ano do ensino fundamental)
VAIDADE
Sonho que sou a Poetisa eleita,
Aquela que diz tudo e tudo sabe,
Que tem a inspiração pura e perfeita,
Que reúne num verso a imensidade!

Sonho que um verso meu tem claridade
Para encher todo o mundo!
E que deleita Mesmo aqueles que morrem de saudade!
Mesmo os de alma profunda e insatisfeita!

Sonho que sou Alguém cá neste mundo ...
Aquela de saber vasto e profundo,
Aos pés de quem a Terra anda curvada!

E quando mais no céu eu vou sonhando,
E quando mais no alto ando voando,
Acordo do meu sonho ... E não sou nada! ...

1 - Publicado em "Livro de mágoas", no ano de 1919, o poema “Vaidade”, de Florbela Espanca, é demarcado por uma quebra de expectativa. Assinale a alternativa que descreve corretamente no que consiste essa ruptura:
a)      O eu lírico, primeiramente, se mostra um ser irrelevante e, ao fim do texto, passa a se enaltecer e se mostrar vaidoso – o que justifica o título do poema;
b)      A quebra de expectativa do poema consiste no fato de que todas as majestosas características que o eu lírico atribui a si mesmo e a seus versos não possuem importância para a compreensão do texto;
c)       O eu lírico se mostra, de início, como uma excelente poetisa. No entanto, a última estrofe conta que essa visão grandiosa de si mesma não se passa de um mero sonho e, na realidade, ela não tem relevância na sociedade a que pertence;
d)      O texto quebra as expectativas do leitor, pois o título “Vaidade” não tem nenhuma relação com a temática abordada no poema.

2 - Observe os seguintes versos e responda:
“Sonho que sou a Poetisa eleita”
“Sonho que sou Alguém cá neste mundo”
Por que as palavras “Poetisa” e “Alguém” aparecem iniciadas com letras maiúsculas? De que modo essa grafia influencia na compreensão do texto?

RESOLUÇÃO COMENTADA
1 – C, pois inicialmente o eu lírico atribui grandiosas características a si mesmo e, no final do poema, afirma que essa idealização sobre ele próprio não passava de apenas um sonho e que não é nada em sua sociedade;

2 – O eu lírico coloca tais palavras iniciadas com letra maiúscula para se enaltecer. Dessa forma, a voz enunciadora se afirma como uma grande poetisa e um grande alguém, o que demarca a ideia vaidosa que, aparentemente, tem de si mesma. Essa grafia é responsável por agregar intensidade às características que a personagem se atribui.

(para 9º ano do ensino fundamental e 1º, 2º e 3º ano do ensino médio)
VOLÚPIA
No divino impudor da mocidade,
Nesse êxtase pagão que vence a sorte,
Num frêmito vibrante de ansiedade,
Dou-te o meu corpo prometido à morte!

A sombra entre a mentira e a verdade...
A nuvem que arrastou o vento norte...
- Meu corpo! Trago nele um vinho forte:
Meus beijos de volúpia e de maldade!

Trago dálias vermelhas no regaço...
São os dedos do sol quando te abraço,
Cravados no teu peito como lanças!

E do meu corpo os leves arabescos
Vão-te envolvendo em círculos dantescos
Felinamente, em voluptuosas danças...

1 - Considerando que o soneto “Volúpia”faz parte do livro “Charneca em flor”, publicado em 1931”, assinale a alternativa que traz corretamente a forma como o eu lírico feminino se apresenta em tal poema:
a)      Uma mulher submissa aos prazeres e desejos de seu parceiro;
b)      Uma mulher pagã, que, em um ato de rebeldia social, vai contra os costumes religiosos da época em que vive;
c)      Uma mulher erótica, que, quando sente os prazeres carnais, se compara a uma felina que dança para seduzir seu parceiro;
d)      Uma mulher dentro dos padrões comportamentais da época, recatada e tímida no que tange aos seus desejos físicos.

2 - Explique por que o poema se contrapõe à visão conservadora que a sociedade dos anos 1920 e 1930 tinha em relação à mulher. Aborde e relacione tal visão com os conhecimentos históricos que possui referente a Portugal, país de origem do texto e da poetisa em questão.

RESOLUÇÃO COMENTADA
1 – C, pois o poema demarca o erotismo presente na obra de Florbela Espanca. Nesse soneto em específico, o eu lírico, ao abordar o desejo sexual, se compara a uma felina que seduz seu parceiro através da dança;

2 – Nos anos 1930, questões de feminilidade eram pouco discutidas em público: embora movimentos feministas começassem timidamente a tentar ganhar voz, a sociedade portuguesa (historicamente cristã) ainda considerava que o campo de atuação da mulher se restringia à família e ao lar e que a figura feminina deveria sempre agir de modo recatado e submisso ao homem, julgado como chefe do núcleo tanto familiar, como amoroso. Nesse sentido, assuntos de cunho sexuais não eram bem vistos quando abordados na voz de uma mulher - Florbela Espanca, no entanto, expõe em seus poemas um erotismo apresentado por um eu lírico abertamente feminino, o que se contrapõe a tal visão conservadora que a sociedade de Portugal tinha sobre a mulher no período em questão.


REFERÊNCIAS:
<https://youtu.be/8Du6lk_ncUw> Acesso em 25/05/2020.
<https://www.revistapazes.com/1085-2/> Acesso em 25/05/2020.


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